PME: O motor silencioso da economia que exige voz e liberdade
- Rita Maria Nunes
- 22 de mai.
- 4 min de leitura
Em Portugal, as Pequenas e Médias Empresas (PME) são o motor silencioso da nossa economia: representam mais de 99% do tecido empresarial e são responsáveis por cerca de 80% do emprego privado. Este dado, tantas vezes repetido, parece, no entanto, ter pouco peso real quando se trata de definir políticas públicas, fiscalidade, ou linhas de apoio económico. Continuamos a assistir à romantização da "grande empresa" e à estatização das soluções para a competitividade — enquanto quem gera riqueza, dia após dia, enfrenta burocracias kafkianas, impostos asfixiantes e uma ausência de representação política real.
O empresário de PME é, muitas vezes, visto como uma figura de "segunda divisão": demasiado pequeno para influenciar, demasiado grande para ignorar. No entanto, é este empresário que, com menos recursos e mais risco, aposta em novos produtos, cria empregos locais e segura a economia em tempos de crise. Seria lógico, portanto, que o poder público lhe desse prioridade. Infelizmente, acontece exatamente o contrário.
Asfixia fiscal e burocrática
Num contexto de inflação elevada, juros a subir e incerteza geopolítica, seria sensato aliviar a carga fiscal das PME. Mas o que se vê é o oposto: aumentos de impostos indiretos, novos custos regulatórios e entraves burocráticos que consomem tempo, energia e capacidade de inovação. Um empresário médio em Portugal gasta mais de 200 horas anuais apenas a cumprir obrigações fiscais. Não é produtivo, não cria valor — é simplesmente sobrevivência administrativa.
Enquanto isso, sucessivos governos vendem aos jornais o número de "apoios" a fundo perdido, linhas de crédito e subsídios. A realidade é que poucos empresários conseguem navegar as complexas candidaturas, prestar as garantias exigidas e suportar os prazos de espera intermináveis. O dinheiro que deveria chegar às PME perde-se em consultores, intermediários e carimbos. Resultado: ajuda para quem menos precisa, e desespero para quem mais trabalha.
PME não querem esmolas, querem liberdade
O empresário de PME não quer um cheque em branco do Estado. Não quer proteções artificiais ou salvamentos periódicos. O que quer — e precisa — é de um ambiente que recompense o mérito, a resiliência e a inovação. Quer menos obstáculos para crescer. Quer poder negociar contratos livremente, contratar com menos rigidez e ser tributado de forma justa.
Há uma inversão de prioridades gritante. Criou-se a ideia de que o Estado é o protagonista da atividade económica, distribuindo recursos de forma paternalista. Esquece-se que são os empresários — e os seus colaboradores — que geram a riqueza que alimenta esse mesmo Estado. Sem lucro, não há impostos. Sem crescimento, não há Estado social. É simples.
Por isso defendo, sem rodeios: menos tutela, mais liberdade económica. Mais confiança na capacidade dos empresários portugueses.
A farsa da "grande empresa salvadora"
Nos últimos anos, a narrativa dominante colocou as grandes empresas no centro das estratégias de desenvolvimento económico. Elas são importantes, sem dúvida. Mas o verdadeiro milagre económico acontece nas micro, pequenas e médias empresas, espalhadas por todo o país, dinamizando setores tradicionais, explorando novas tecnologias, abrindo novos mercados.
Uma política que privilegie apenas o topo da pirâmide é uma política míope e insustentável. A diversidade empresarial é o maior seguro contra crises sistémicas. Foi a capacidade das pequenas empresas de se reinventarem rapidamente que evitou um colapso económico maior durante a pandemia. Não nos esqueçamos disso.
A proposta: dar voz às PME
É preciso criar uma voz estruturada para as PME, capaz de influenciar de forma efetiva o debate público e a formulação de políticas. Hoje, muitas associações de empresários atuam como meras extensões das agendas governamentais, em vez de defenderem com independência e coragem os seus representados.
Defendo a criação de um Conselho Nacional das PME: um órgão independente, composto por empresários em atividade e não por políticos aposentados ou gestores públicos reciclados. Um espaço onde se fale a língua da realidade empresarial, e não do politicamente correto.
Este Conselho teria como missão:
Propor legislação simples e orientada para resultados.
Avaliar o impacto real de medidas fiscais e laborais nas PME.
Representar as PME em todas as instâncias de negociação económica, nacional e europeia.
Promover uma cultura de responsabilidade e transparência no setor.
Reforma fiscal para a liberdade
Nenhuma mudança será sustentável sem uma profunda reforma fiscal. A fiscalidade portuguesa é punitiva para quem trabalha, para quem investe e para quem arrisca. Propomos:
Redução do IRC para PME para níveis competitivos face à média europeia.
Simplicidade no IVA: com isenções automáticas para microempresas e prazos de reembolso eficazes.
Abolição de taxas e taxinhas inúteis, que só alimentam a máquina burocrática sem qualquer retorno visível.
Não se trata de dar benefícios especiais às PME. Trata-se de criar um terreno de jogo justo, onde o tamanho não seja uma sentença de morte.
PME: protagonistas da mudança
Se queremos uma economia portuguesa mais resiliente, inovadora e próspera, temos de mudar a lente com que vemos as PME. Deixá-las competir livremente. Reconhecer a sua importância sem condescendência. Criar políticas que libertem em vez de aprisionar.
Em última análise, fortalecer as PME é fortalecer a liberdade económica, a criação de riqueza e a coesão social. O futuro não se constrói em gabinetes ministeriais; constrói-se no chão das empresas, nas fábricas, nos escritórios, nos cafés, nas startups que nascem todos os dias.
E é hora de darmos voz a quem nunca a teve — mas sempre sustentou todos os outros.
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